Personalie

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

CAPÍTULO NOVO - Extra

Ops, calma! Ainda não é o 17º! Este capítulo miudinho é extra, ele vem antes do primeiro capítulo e é na versão do Anjo.
Espero que gostem =D Para quem ainda não começou a ler o livro, é uma ótima hora, pois este capítulo extra vem antes do capítulo 1, que eu já postei no blog junto com os outros capítulos (até o 16º).

O final sai ainda esse mês ;D
Mais uma vez, desculpem pela demora. Mas sabe como é... Quando a gente tá de férias, é FÉRIAS mesmo, AHEAEHU.

Bjs. Ah, Um feliz 2010 para todos vocês *---*

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CAPÍTULO EXTRA

Era mais uma manhã de primavera, daquelas bem normais, no lugar onde chamamos de “paraíso”. E pode-se mesmo chamar aquele lugar de paraíso... Não só pela paisagem natural, mas também pelas pessoas – acho que posso chamar a mim e aos meus colegas de pessoas – que ali habitam.

Já fazia muito tempo que eu fazia parte dos Anjos-inativos – quero dizer, dos Anjos que ainda não receberam nenhuma missão de proteção -, nunca tinha entrado em nenhuma missão sozinho, e nunca pensei que fosse ser encarregado de uma.

Eu era o Anjo mais esquisito dali. Não sabia o meu nome, nem mesmo quem eu tinha salvado para me tornar um anjo. E como ninguém mais sabia sobre mim – a não ser o Anjo superior, Gabriel/Gabreel, e Deus, claro -, eu não tinha como descobrir.

Aliás... Até esse dia eu não tinha como.

- Anjo, prepare-se, será mandado a terra em breve. – Anunciou Gabreel, enquanto eu observava outros Anjos no enorme Jardim que se estendia por ali.

- Como? Eu? O Anjo-sem-história? – Perguntei incrédulo.

Gabreel sorriu para mim. O seu sorriso se destacava na pele morena dele.

- Garanto a você que não voltará desta missão conhecido como “o anjo-sem-nome” ou “o-anjo-dos-olhos-de-violeta”.

Comecei a me interessar pela missão...

- E o que tenho que fazer? - Já estava bem animado, e sentia o meu sorriso crescer de uma orelha a outra.

- O que todos os outros anjos fazem: Levar felicidade a um mero mortal que passa por dificuldades.

- E quem é o meu protegido?

- A sua protegida. É uma garota. – corrigiu ele – Letícia Xavier. Tem 16 anos e mora no nordeste brasileiro, em uma cidade grande, de onde o pai é prefeito.

- E por que ela precisa tanto de mim?

Ele me olhou nos olhos com uma expressão séria.

- Bom, isso você mesmo terá que ver. – Gabreel estendeu a sua até a minha bochecha, eu já sabia o que ele ia fazer.

Em fração de segundos, eu não estava mais naquele jardim rodeada de Anjos. O ambiente era totalmente diferente, mas conhecido. Havia muito tempo que eu não ia ao mundo das pessoas vivas. A última vez tinha sido com Lise, quando fui acompanhá-la em uma missão, mas o garotinho protegido só podia ver ela, pois eu não era o seu Anjo, estava ali apenas acompanhando a sua verdadeira protetora.

Engraçado como todas as cidades grandes são parecidas... Todas são cheias de carros e prédios, e o cheiro delas não é bom como o do Jardim dos Anjos – que costumo chamar de Paraíso.

- Onde estamos, exatamente? – Perguntei.

- Vitória da Conquista, Bahia. E aqui será o seu lar por algum tempo. – Respondeu ele enquanto atravessávamos a rua, sem nos preocupar com os carros que rodavam para lá e para cá o tempo todo, afinal, eles não podiam nos atropelar, pois não éramos reais ao mundo deles, portanto, nada que compõe o mundo dos vivos pode nos tocar.

Um carro nos atravessou enquanto eu observava cada canto daquele verdadeiro “inferno”, com tanto barulho e fumaça.

- Gabriel...- Comecei com uma careta – Tem que ser aqui? Não posso ficar em um lugar mais reservado? Uma fazenda, talvez, levando felicidade a um caipira...

- Não, Anjo. – Interrompeu ele, sem nem me deixar terminar de falar – Só Letícia poderá ajudá-lo a descobrir quem você foi.

- Mas, Gabreel! Você sabe de tudo! Por que simplesmente não me conta? – Pedi. – Por favor.

Nessa hora paramos de andar, estávamos parados na frente de um prédio com um imenso jardim na frente, onde tinha uma placa que se lia “CAMPUS”.

- Eu já lhe disse, Anjo. – Explicou Gabreel, me olhando com a sua expressão séria mais uma vez – Isso faz parte da sua missão. Você ajudará Letícia, e ela ajudará você.

Ele tinha razão. As missões eram coisas do destino, como ele mesmo já tinha me explicado antes, não podemos mudá-las.

- Tudo bem. – Concordei, afinal, eu tinha outra escolha?

- Então, este é o colégio onde Letícia estuda, e logo ela estará chegando. Mas ela ainda não pode vê-lo, nem escutá-lo, pois ainda não precisa de você. Quando ela precisar de você, poderá te escutar, e se você permitir, ela também poderá vê-lo, então, quando a hora chegar, deixe que ela o veja.

- Ok. E o que eu faço depois?

Ele sorriu.

- Você saberá.

Forcei um sorriso. Mas acho que não consegui esconder a minha cara de “não-sei-o-que-fazer”.

- Não se preocupe, Anjo. – Gabriel voltou a dizer, agora me dando uns tapinhas de apoio nas costas – Dará tudo certo! Ah, lá vem a sua protegida!

Um carro preto, chique e bonito parou na frente da escola. Alguns segundos depois a porta se abriu, e de dentro saiu uma garota de estatura média, cabelos negros que batiam na cintura, e o que mais me chamou atenção: um sorriso imenso exposto no rosto.

- Ela não parece triste. – Falei.

- Ainda não. – Disse Gabreel.

Continuamos observando por mais um tempo...

A garota se despediu de quem estava no carro, ainda alegre. Pobre garota... Estava tão feliz! Por que algo de ruim teria que acontecer com ela?

De uma hora pra outra, ela parou de dançar em direção ao prédio, parecia que estava tonta ou algo do tipo. Foi ai que o garoto que estava no carro, que aparentava ser poucos anos mais velho que ela, saiu para ampará-la.

- O que está acontecendo? – Perguntei atordoado. Um instinto de proteção crescia dentro de mim. Eu não entendia o porquê, mas queria ir até lá e ampará-la também!

- Ela está tendo um pressentimento do que vai acontecer a seguir.

- E por que isso? – Perguntei ainda atordoado.

- Porque o que vai acontecer envolve ele – Gabriel apontou para o garoto que a ajudava, o mesmo que tinha saído de dentro do carro -, e eles tem uma forte ligação amorosa, o que a faz pressentir que algo ruim vai acontecer.

- Ah, entendi. Eles são namorados?

- Não. – Respondeu Gabreel.

- Então o que eles são para serem tão “conectados”?

- Além de amigos, você só descobrirá com o tempo.

O garoto voltou para o carro, e Letícia continuou a caminhar até o prédio. Eu queria observar mais, só que Gabreel me trouxe novamente para o Paraíso antes que eu pudesse falar qualquer coisa.

- Por que voltamos? – Perguntei quando paramos no mesmo lugar que estávamos antes de irmos até o mundo dos vivos.

- Daqui pra frente terá que se virar sozinho. Ir ao mundo dos vivos e retornar ao jardim sem mim. Terá que observar a sua protegida e conhecê-la o bastante para poder ajudá-la quando ela precisar, e não se esqueça de fazer tudo com amor.

Enquanto ele falava, eu ia balançando a cabeça para mostrar que estava concordando.

- Mas como faço para viajar entre os mundos? – Perguntei.

- Não é difícil. Só precisa imaginar o que quer. – Respondeu.

- Ah, tudo bem. – Eu falei “tudo bem”, mas na verdade não sabia se conseguiria.

- E você sabe que, por ser um anjo, pode visitar os sonhos dela sempre que quiser. Já que nunca usou esse seu poder, pode desfrutar dele agora. – dizia ele enquanto se virava apressado – Agora tenho que ir, são muitas missões para distribuir... Boa sorte, Anjo! Sei que vai se sair bem!

Então, do nada, ele sumiu no meio do jardim.

Que ótimo. Minha primeira missão e eu não tinha a mínima idéia do que fazer!


CAP. 16 – O presente do Anjo.



O sol estava se pondo. E logo a lua apareceria para ser iluminada pelo sol.

Era tão bom ver o pôr-do-sol... Mas quando você o vê longe da pessoa – ou anjo – que você ama, ele fica meio sem graça. Ou com mais graça ainda.

A lembrança de Frederic estava presente ali, era como se ele estivesse do meu lado, mas eu não podia vê-lo. Não sei explicar se o pôr-do-sol amenizava ou piorava a dor que eu sentia, a dor da saudade.

Por um lado, era bom lembrar dele. Porque me fazia feliz. Mas depois, quando eu caia na real e via que ele nunca mais voltaria, eu retornava ao buraco fundo da solidão e da tristeza.

Enquanto observava o pôr-do-sol, tive a impressão de ouvir alguém se aproximar. Olhei ao redor, mas não vi ninguém além das criancinhas que passavam pelo outro lado do jardim com os pais ou babás, indo embora, porque com a chegada da noite, a praça não era mais das crianças, mas sim dos casais. As vozes pareciam estar muito perto.

- ... Não posso viver indo embora e voltando de novo, Gabriel! Não vê como ela fica toda vez que eu vou embora?

- Ah, Anjo, aposto que ela adoraria vê-lo mais uma vez!

O quê? Mas... Como?

Eu tinha certeza que uma das vozes era a de Frederic!

Eufórica, comecei a procurar por ele. Eu sabia que ele estava perto, mas eu não conseguia vê-lo! Olhava para todos os lados, e nada.

- Vamos lá, Frederic, deixe-a vê-lo. – Pediu a voz desconhecida.

- Não sei, Gabriel... Não quero ferir os sentimentos dela novamente.

As vozes pareciam despreocupadas. Com certeza eles não tinha a mínima que eu estava ouvindo-os. Resolvi fingir não estar percebendo, para evitar que se calassem.

- Olhe só para ela – Quando a voz desconhecida, que parecia ser de alguém chamado Gabriel, falou isso, eu me encolhi -, veja como ela está triste. Ela está sentindo a sua falta.

Nesse momento tive vontade de chorar, mas me contive.

- Eu sei. Eu também sinto a falta dela. Você nem pode imaginar o quanto...

Sorri um pouco. Era bom saber que ele também estava com saudade de mim.

- Então... O que está esperando? – Dizia Gabriel – É a primeira vez que algo assim acontece. Você sabe que a intenção dos céus é fazer amor, e não destruir. Tenho certeza que vamos achar uma solução para vocês. Enquanto isso... Aceite o meu presente.

- Promete que vai achar uma solução? – Perguntou Frederic.

- Sim, rapaz. Eu prometo.

Me preparei para ver Frederic. Algo me dizia que eu iria vê-lo. Eu não conseguia controlar a felicidade que eu sentia.

Mas por outro lado, sabia muito bem o quanto sofreria quando ele partisse novamente. Entendi muito bem quando ele disse que não queria ferir os meus sentimentos novamente, mas por outro lado, entendi quando Gabriel disse sobre ele deixar que eu o visse mais uma vez. Claramente eu não podia vê-los porque eles estavam impedindo isso de alguma maneira.

Eu só não entendia porque conseguia escutá-los...

Nesse momento a praça estava vazia.

Apenas eu, as árvores e as vozes.

Mas onde estavam os donos delas?

O silêncio tomou conta do lugar. Eu não ouvia mais as vozes.

E logo percebi que – provavelmente - tudo não passava de coisas da minha cabeça.

Talvez eu estivesse entrando em algum tipo de depressão.

Talvez Frederic nunca tivesse existido. Talvez ele fosse apenas uma invenção da minha cabecinha solitária.

Um amigo imaginário, talvez. Eu já tive um. Mas eu só tinha 8 anos, e ele era vede de antenas cor-de-rosa.

E Frederic não. Ele era tão real (quer dizer, tirando o fato de ele poder flutuar e atravessar coisas sólidas do meu mundo)... Ele era mais do que o meu amigo. Mais do que o meu anjo da guarda – ou o meu amigo imaginário?. Ele era o amor da minha vida.

Haha.

Como eu não tinha pensado nisso antes?

Como pude ser tão boba?

Ser enganada por mim mesma! Pela minha própria solidão!

Só agora, com a dor, eu podia perceber que tudo não devia passar de um pesadelo daqueles bem longos, ou simplesmente de algum delírio da minha cabeça. Em que mundo anjos viriam dar apoio a alguém que quase nunca vai a igreja? Em que mundo seres humanos se apaixonam por seres que já morreram? Ou melhor... Em que mundo os anjos são reais?

Com certeza não no mundo real.

Mas agora era tarde demais.

Eu estava envolvida demais nesse pesadelo.

Eu estava completamente apaixonada por algo inventado pela minha própria mente.

E pior. Eu não tinha a mínima idéia de como voltar para o mundo real.

Levantei chorando do banquinho da praça. Ainda bem que não tinha ninguém por lá, seria bem estranho sair chorando com um monte de gente olhando.

Antes de entrar em casa, limpei os olhos para que ninguém percebesse que eu estava chorando. Ou pior, que eu estava louca.

Foi bom eu ter feito isso, porque meus pais me esperavam na sala.

- Querida! Parabéns! Melhores notas da sala de novo! – Dizia o meu pai enquanto via em minha direção com o boletim na mão.

- Ah, legal. Obrigada, pai.

- Letícia, a escola ligou e pediu para você ir ajudar na arrumação amanhã. – Disse minha mãe.

Novidaaaaaade. A escola sempre liga. Já era de se esperar.

- Ok. – Respondi.

- Com essas notas você merece um presente! O que você quer ganhar? – Perguntou papai, sorridente.

- Hum... Não sei. Tanto faz, acho que passar de ano é a minha obrigação.

- Ai meu Deus, essa garota só pode ter puxado a você, Victor. Nunca vi alguém tão sem orgulho. – Resmungou a minha mãe – Bom, pois eu tenho uma idéia de presente. O seu vestido para usar amanhã. Acho que aquele que você comprou no mês passado não vai servir mais, você deve ter engordado uns dois ou três quilos, passou o mês todo se empanturrando de bolo de chocolate e refrigerante. Ah, e você tem salão amanhã às seis horas, tomei a liberdade de marcar porque sei que você nem se lembrou de fazer isso.

- Legal, mãe. – Respondi exausta.

- E seu jantar hoje não vai ser bolo de chocolate com coca-cola, mandei preparar uma sala natural pra você, tem que se alimentar melhor.

- Salada? Eca! – Fiz uma careta – Mas mãe... Não me importo em engordar.

- Mas eu me importo. E sem mais “mas mãe e mas mãe”, é isso e ponto final.

Procurei o meu pai para me defender, mas ele já tinha fugido da sala.

Provavelmente na hora que mamãe começou a tagarelar, porque ele já sabia que se não saísse ia sobrar pra ele.

Depois de ser obrigada a comer salada e esperar todos – meu pai e minha mãe, que insistia em comer bem devagar - terminarem o jantar, finalmente consegui subir para o meu quarto, onde eu podia sofrer em paz, tendo como conselheiro o meu travesseiro, que sempre fazia o doce papel de secar as minhas lágrimas enquanto eu abafava o choro nele.

Tomei um banho quente e vesti um pijama bem fresquinho, também abri a janela para deixar correr um ar dentro do quarto. O dia amanhã seria bem agitado, porém bem sem graça. E eu tinha que dormir bem para agüentar o dia seguinte. E além do mais... Vai ver se Frederic não aparecia nos meus sonhos?

Tá. Ele nunca mais iria voltar. Mas eu ainda não tinha me acostumado com a idéia de ele ser apenas uma invenção da minha cabeça... Quer dizer, eu não seria criativa o bastante para isso, nem estando maluca.



********************



Devia ser quase meia noite quando despertei de um pesadelo.

Na verdade, era a reprise do sonho que eu havia tido na noite anterior.

Mas só as partes ruins dele.

A hora em que Frederic ia embora, e eu tentava pegar a mão dele e segurá-la, mas algo o levava para longe.

Acordei desesperada, como sempre acontecia quando eu tinha um pesadelo.

Ofegante, tomei um gole d’água da garrafa que eu tinha deixado sob a mesinha de cabeceira antes de dormir.

Estava quente, mas tudo bem.

Enquanto bebia a água, percebi o quanto ventava lá fora. A cortina balançava pra lá e pra cá por cima da janela escancarada. O cheirinho de verão penetrava no quarto como se fosse um perfume doce e forte. Era disso que eu estava precisando: Cheirinho de novo em vez de cheiro de mofo, pois era assim que o quarto estava antes de eu abrir a janela.

A mudança foi tão forte e boa que me fez levantar da cama e ir até a janela.

Lá fora, a Lua brilhava se destacando no céu, assim como as pequenas – bom, elas pareciam bem pequenas - estrelas ao seu redor.

De joelhos na cama e com os cotovelos apoiados na janela, fechei os olhos e relaxei.

Engraçado como quando você está relaxando, você sempre se lembra daqueles momentos mágicos que você tem certeza que nunca vai esquecer.

A primeira lembrança que veio a minha mente foi a do beijo de Frederic.

O melhor sonho que já tive.

Mas também o pior pesadelo.

Era como se eu estivesse dentro daquele sonho. Com aquele vestido branco de seda. Na praça vazia, no meio do nada. Era como se eu estivesse sentindo, naquele momento, a mão do Anjo tocar o meu rosto, limpando toda lágrima que caia por ali. Sentindo os lábios dele tocando os meus, a mão dele nas minhas costas... O seu cheiro de verão.

E de repente, comecei a sentir isso de verdade...

O colchão da cama cedeu como se estivesse recebendo mais um peso. Senti a mão dele passar pelas minhas costas, agarrando a minha cintura em um abraço enquanto eu apertava os olhos tentando fazer a ilusão passar. Senti o queixo dele repousar no meu ombro. O seu doce cheiro de verão cada vez mais penetrante. E finalmente escutei:

- Eu voltei.

Eu sabia que aquilo era apenas mais um sonho. Mas não era por isso que eu devia ignorá-lo. Eu sabia muito bem o quanto sofreria ao acordar, mas não me controlava em aproveitar o momento.

Então, sem euforia nenhuma, ciente de que tudo não passava de uma ilusão, abri os olhos e virei para olhá-lo.

Os seus olhos de violeta brilhavam apenas com a luz do luar, entrando em sintonia com a cor da noite e o cheiro que vinha dele mesmo – e do verão.

- Vou sentir a sua falta. De novo. – Sussurrei enquanto tocava os lábios no rosto dele.

- Não vai mais. Vim para ficar. – Disse ele.

Apenas ri. Como eu sonhava positivo...

Então, sem criticar a minha ilusão, joguei os braços ao redor do pescoço dele e o beijei.

As mãos dele desciam e subiam pelas minhas costas, mas não de um jeito vulgar... Era mais como um carinho. Enquanto isso, eu enrolava os dedos no cabelo dele, macio como o pelúcia.

Finalmente os meus joelhos cederam, e eu cai na cama com ele por cima de mim. Se isso fosse real, eu poderia dizer que estávamos indo longe demais...

Até que ele parou de me beijar e voltou a ficar de joelhos sobre a cama.

- O que foi? – Perguntei.

- Não podemos ser pegos. Agora eles podem me ver. – Respondeu Frederic em um tom de voz baixo.

Levantei e fiquei de joelhos também, estendi a mão até o pescoço dele e o beijei novamente.

- Ninguém vai nos pegar. E se nos pegarem, não vai haver problema nenhum, afinal, é apenas um sonho. – Falei e voltei os meus lábios para os dele.

Ele interrompeu o beijo com uma risada.

- Isso não é um sonho. É real. – Disse ele, e voltou a me beijar.

Agora foi a minha vez de interromper o beijo.

- Haha, por que está mentindo? Bom, tanto faz, sei que amanhã vou acordar e não irei te encontrar aqui, então, por favor, me deixe aproveitar. – Voltei a beijá-lo.

Depois de um tempo, ele finalmente parou e voltou a falar:

- Se não acredita em mim, tente acordar.

Acordar? Eu queria voltar para os braços dele!

- Fred, não quero acordar. – Falei – A realidade é muito ruim para mim, pois não posso encaixar você nela.

Ele mordeu os lábios e pareceu pensar um pouco, então, disse:

- Eu prometo que você já está acordada. Agora, apenas tente. Vamos, tente.

Ai ai... Eu sabia que iria me arrepender por isso. Mas talvez fosse melhor mesmo, eu podia aprender com isso e parar de mergulhar em fantasias.

- Tudo bem. – Falei.

Então comecei a tentar acordar...

Eu fechava e abria os olhos, me mexia inquieta, até tentei me beliscar, mas nada me fazia acordar. Fui até a janela.

- O que vai fazer? – Perguntou o Anjo.

- Vou pular. É o bastante alto para me fazer pensar que morri e eu acordar naturalmente.

- Está ficando louca? Você vai morrer de verdade se fizer isso!

- Mas eu tenho que saber se estou acordada!

Coloquei um pé para fora da janela. Senti o vento bater na minha perna e levantar o short do meu pijama.

De repente, senti algo real naquilo tudo...

- O medo não a faz perceber que isso tudo é real? – Perguntou ele.

O medo... Era isso!

Eu estava... Com medo.

E nos sonhos, sempre vencemos o medo. Pois simplesmente sabemos que é um sonho!

- Ai meu Deus! – falei – Você tem razão! Eu estou com medo!

Desci da janela rapidamente e a fechei.

Olhei para Frederic, que agora estava de pé no chão, enquanto eu continuava de joelhos na cama.

Sorri.

- É real! – Exclamei.

- Sim. – Confirmou ele sorridente.

- Mas... Como?

- Gabriel, ou Gabreel, como é mais conhecido aqui, conversou com os outros Anjos-Pais e eles chegaram a conclusão de que duas pessoas que se amam devem conviver juntas, e eles levaram o nosso caso em questão, e resolveram que eu posso continuar a ser o seu Anjo. – Explicou ele. – Até que a morte nos una novamente.

- Meu Deus! Não acredito! – Dizia eu enquanto o abraçava – Então quer dizer que você vai ser assim pra sempre, que você ganhou uma nova chance de viver?

Ele suspirou.

- Hum... Não. Na verdade, só tenho essa forma humana até a meia noite de amanhã. Foi um presente de Gabriel, por termos cumprido as nossas missões e pelo nosso amor.

Não fiquei triste com a notícia. De verdade. Tê-lo como Anjo já era o bastante.

- Então vamos curtir até a meia noite. – Falei.

- Mas mesmo depois de amanhã, os seus sonhos ainda serão meus, e as noites serão nossas.

- Pode ficar com os meus sonhos, só tem graça de forem com você.

Voltamos a nos beijar. Até... Bom, não sei até quando.

- Eu te amo. – Disse ele, em uma das pausas dos nossos beijos.

- Eu te amo mais. – Falei, e voltei aos seus lábios.

********************



Juro que aquela foi a manhã mais linda de toda a minha vida.

Acordei com o som dos passarinhos na janela, que estava aberta, e com a luz no sol que iluminava e arejava todo o quarto. O cheiro de verão continuava forte e penetrante dentro do quarto.

Mas, por outro lado, eu estava triste. Porque sabia que o que tinha acontecido na noite anterior não passava de um sonho. Com certeza o sonho mais real que eu já havia tido.

Os indícios para que o ocorrido fosse um sonho eram que:

1) A janela estava aberta quando eu acordei, e no sonho eu havia fechado-a.

2) Frederic não estava ali.

Mas eu sentia que aquilo tinha sido real. De alguma forma, eu tinha certeza.

Meus lábios estavam um pouco adormecido. Como isso tinha acontecido se era só um sonho?

Sentei na cama e fiquei pensando um pouco....

Sonho ou realidade?

- Pronta para o mundo real, princesa? – Disse ele saindo de dentro do banheiro com apenas dois botões na camisa abotoados, de forma que metade do seu peitoral estivesse descoberto. O cabelo dele estava molhado, de modo que ficou claro que ele havia usado o chuveiro.

Por um momento fiquei paralisada.

Ai. Meu. Deus.

O que nós fizemos na noite passada?

De repente, entrei em pânico.

- Frederic! O que aconteceu? Nós...

Ele demorou um minuto para entender sobre o que eu estava falando.

- Oh, não, não, Letícia! Não fizemos isso... – Ele passou a mão no cabelo molhado, jogando-o para trás – Bom, não que eu me lembre.

- Ai meu Deus, minha mãe vai me matar, e o meu pai vai te matar.

- Acho que não, eu já morri, esqueceu?

- É. Mas bem, acho que não fizemos nada de mais... Eu nunca fiz “isso”, mas acho que se tivesse feito teria me lembrado, certo?

- Eu também não. E além do mais, se tivéssemos ido longe demais, Gabriel já teria me impedido de ficar aqui, afinal, luxuria é um dos sete pecados capitais, e eu continuo sendo um anjo...

É. Com essa eu aliviei.

- Tem razão. Não fizemos nada de mais.

Ele sorriu e veio até mim para me dar um beijo. Foi nessa hora que alguém bateu na porta.

- Letícia! Acorda! – Era minha mãe. Com o susto, eu e Frederic nos afastamos e nos olhamos com aquela cara de “ai meu Deus, e agora?” – Abra a porta! Tenho uma surpresinha pra você!

- E agora? – Sussurrou Fred.

- Vai pra debaixo da cama! – Apontei.

Rapidamente ele se enfiou lá embaixo.

- Espera, mãe. Já estou abrindo, deixa só eu... me vestir.

- Anda logo, garota, eu não tenho a manhã toda.

- Pronto, já estou indo.

Abri a porta, e lá estava ela: maquiada e penteada às oito da manhã, e para completar, com uma caixa enorme na mão.

- O que é isso? – Perguntei.

- O seu vestido para hoje a noite! – Ela respondeu radiante. – Saia da frente e me deixe entrar, quero ver como ele vai ficar em você!

Mamãe praticamente me empurrou e entrou no meu quarto sem nem pedir “licença”. Uau, quanta educação.

- Hum... Mas que cheiro é esse? – Perguntou ela, me olhando com uma cara desconfiada.

Mordi os lábios e pensei em uma desculpa.

- Eu deixei a janela aberta a noite, o quarto está arejado. É só isso.

Enquanto mamãe se virava para conferir a janela aberta, olhei para a cama e consegui ver Fred tentando observar o que se passava.

- Não é só isso. Parece mais um... Perfume. – Dizia ela enquanto rodava o quarto com a caixa na mão.

Ela abriu a porta do banheiro, olhou lá dentro, e voltou a me olhar.

- O q-que foi? – Perguntei.

- Nada. – Respondeu ela, ainda mais desconfiada.

- Bom, mãe, vamos logo ver esse vestido! Não vejo a hora de experimentá-lo!

Por sorte, minha mãe acabou contagiada com o meu “humor” e, alegremente, colocou a caixa sob a cama e tirou o vestido de dentro.

Era branco e de renda. Tinha algumas flores pequenas cor de violeta prestas na barra da saia e na cintura. As alças eram fininhas e de fitas brancas rodeadas com uma borda lilás, que prendiam do busto e amarravam ao redor do pescoço.

Tenho que admitir: A minha mãe era ótima com essas coisas.

- É... Perfeito! – Falei ao vesti-lo.

- Eu sabia que você ia gostar! Ah, e tem a sua sandália! Você vai amar!

De dentro da caixa, mamãe tirou uma sandália de salto fino, da mesma cor do vestido, com uma fita lilás que prendia no tornozelo.

Experimentei-a. Coube direitinho, e deixou o vestido ainda mais perfeito.

- Comprei pensando nesse vestido. – Disse mamãe, ajeitando os últimos detalhes na parte de trás do vestido.

- Obrigada, mãe. – Falei.

- Não seja boba, Letícia, acha mesmo que eu ia deixar você ir a festa de fim de ano da sua escola com um vestido qualquer? Não mesmo! Como filha da primeira dama...

Ela começou a tagarelar, mas como eu não estava muito a fim de ouvir ela se gabar, não prestei atenção. Apenas fiquei falando coisas como “É” e “Ah” e “Ahaan” toda vez que ela falava “Não é verdade?”.

Quando já ia fazer uma hora que ela estava me atormentando com aquele papo de “primeira dama”, eu finalmente falei:

- Mãe, tenho que tomar banho... Preciso ir pra escola daqui a pouco.

- Ah! Verdade, querida! Nem percebi o tempo passar! Ande rápido, quero você aqui antes da seis da tarde, marquei salão para você! – Dizia ela enquanto saia do quarto levando o vestido, a sandália e a caixa.

Assim que ela saiu, corri para trancar a porta.

- Ufa. – Suspirei. – Essa foi por pouco.

- É. – Concordou Fred enquanto saia do seu esconderijo.

- Precisamos achar um jeito de te tirar daqui sem que ninguém te veja. – Falei.

Frederic olhou para os lençóis e para a janela.

- Está pensando o mesmo que eu? – Perguntou ele.

Fui até a janela para conferir que não havia ninguém na varanda que tinha lá embaixo.

- Sim. – Respondi com um sorriso.

Amarramos um monte de lençóis e os transformamos em uma corda gigante. Fred amarrou uma ponta na cabeceira a cama, e a outra ele jogou lá embaixo.

Antes de descer, ele me deu um beijo.

- Espero você na porta.

- Ok. – Falei.

Fiquei observando ele descer pelos lençóis, e rezando para que ninguém o pegasse quando ele fosse pular o muro.

Quando ele chegou lá embaixo, jogou um beijo para mim e eu acenei a mão para ele. Rapidamente ele pulou o muro e eu não consegui mais vê-lo.

Agora era hora de me preparar para o grande dia. Até a meia noite.


CAP. 15 – Vazio

O “Letícia” que eu ouvia na voz do meu anjo foi mudando para uma voz diferente, mas conhecida. Agora era meu pai que me chamava. Mas não era ele quem eu procurava.

Tentei chamar por ele mais uma vez, agora, mais alto do que nunca.

- FREDERIC!

O grito só serviu para uma coisa: Acordar-me de vez.

Abri os olhos, ainda ofegante de tanto gritar, pelo que parecia, eu não gritava apenas no sonho.

Meus olhos, ainda assustados, fitavam o cobertor bege que cobria minhas pernas. Eu não sabia como, mas estava deitada na cama.

Alguém mexia no meu cabelo e deslizava os dedos sob algo dolorido em minha testa.

- Filha? – Perguntou, provavelmente, o dono da mão. – Você está bem?

Eu ia responder que sim. Mas um soluço ecoou de mim antes que eu pudesse formatar as palavras.

Eu estava chorando.

Sem limpar os olhos, sem ter a mínima idéia do meu estado, levantei os olhos na direção da única pessoa que me chamava de “filha”. Meu pai.

Ao lado dele, estava vovó. Os dois com rostos preocupados esperando alguma resposta minha.

Percebi que já era dia, a janela estava aberta e iluminava e arejava todo o quarto. Também avistei uma maleta de primeiros socorros caseira do lado dos meus pés cobertos.

Só então me toquei que a dor na testa devia ser em conseqüência da batida forte contra a parede no dia anterior, tentando impedir que Frederic fosse embora.

- Vou pegar um copo d’água para ela. – Vovó disse baixinho.

Meu pai apenas concordou com a cabeça. Quando vovó não estava mais no quarto, ele começou a falar.

- O está acontecendo, querida? – Perguntou ele, não mais com as no meu cabelo, agora estavam sobre os seus joelhos.

A expressão dele exigia uma resposta verdadeira.

Eu confiava muito no meu pai, mas não podia contar a ele sobre Frederic, até porque ele nem se quer acreditaria! Afinal, quem iria acreditar em anjos tão concretamente em pleno século XXI? Nem eu mesma acreditava antes de Frederic aparecer e mudar tudo em minha vida...

- N-nada. – Menti.

Eu já não chorava tanto, o susto parecia ter passado, mas eu continuava mais triste do que nunca.

- Hum... É algum... garoto? – Perguntou ele constrangido.

- N... – Tentei responder, mas antes ele me interrompeu.

- Lê, você sabe que pode me contar essas coisas... Seja lá quem for esse Frederic e...

- O quê? – Arregalei os olhos.

Como ele sabia sobre Frederic?!

- Bom, você falava muito o nome dele enquanto dormia.

Ah, que ótimo. Denunciada pelos meus sonhos.

- E-eu... Não conheço nenhum Fre-deric.

Depois de um suspiro ele levantou-se e disse:

- Tudo bem.

Vovó entrou no quarto com a minha água.

- Aqui está. – Disse ela me entregando o copo.

Agradeci e bebi um gole.

- Acho que a deixei um pouco... agitada ontem. – vovó falou ao meu pai - Pode levá-la para casa, Victor. A enfermeira já está aí, mesmo que eu não vá precisar dela.

- Sim, acho que a Letícia também deve está querendo ir para casa... Amanhã é o baile de fim de ano da escola dela e ainda tenho que passar na diretoria do Campus para pegar as notas finais dela que saem hoje. – Respondeu papai.

Assim que ouvi “notas finais” engasguei com a água. Mas eles – quero dizer, vovó e papai – não perceberam porque estavam entretidos demais na conversa deles.

- Ah, me ligue para avisar que minha neta vai para o último ano no ano que vem! - É. Eu nunca tinha me preocupado com as minhas notas, não é agora, com problemas maiores que eu vou me preocupar com isso... - E não se esqueça de me mandar notícias sobre o meu net... o Lucas.

- Tudo bem, mãe, ela sabe da história. - Falou papai.

Pelo jeito vovó já estava por dentro da história sobre Lucas.

- Uuh... Não quero nem pensar o que a cobra da sua esposa vai falar quando descobrir.

- Mãe, não fale assim da Lúcia.

- Ah, querido, você sabe que eu nunca gostei daquela cobr...

- Mamãe... A sua neta. – Advertiu meu pai. Mas eu não ligava para o fato de vovó não ir com a cara da mamãe, metade do planeta também não ia.

Ela apenas fez uma cara de quem não estava nem ai.

A conversinha deles durou até a última gota do meu copo de água. Então papai desceu as escadas para me esperar lá embaixo. Foi aí, a vez da conversa com a vovó:

- Desculpe se lhe assustei com a história do... Frederic.

Engoli em seco.

- N-não... Tudo bem.

Ela sorriu e beijou o topo da minha testa.

- Uau, isso deve estar doendo! – Disse ela.

- Um pouco... – Menti. A dor aumentava a cada minuto, mas não se comparava a dor de dentro.

- Bom, vou descer e deixar você se arrumar. Sei que deve estar louca para voltar a “civilização”!

Eu ri. Uma das coisas que eu mais gostava em vovó, era o jeito divertido dela, o jeito que ela me fazia rir mesmo quando isso era a última coisa que eu queria fazer no mundo.

Ela virou as costas e, com o braço bom, abriu a porta, fechando-a assim que passou por ela.

Vazio.

De agora em diante seria assim... Vazio.

Dentro de mim, eu seria como um quarto vazio. Os quadros pendurados nas paredes seriam os retratos das lembranças, a porta e as janelas seriam a chance de povoar a minha vida outra vez, mas isso seria difícil, pois essas janelas e essa porta estavam trancafiadas e eu não sabia onde a chave estava... Assim como eu não sabia por onde o meu Frederic andava.

Não teria mais aquela pessoa, ou melhor, aquele anjo, todos os dias no meu quarto, completando o espaço vazio.

Ele se fora, e de agora em diante, não seria mais nada. Só o vazio.

Dormi no caminho de volta quase todo. Estava cansada. Mesmo tendo dormido quase doze horas, parecia que fazia tempos que eu não pregava os olhos. O sonho da noite anterior tinha sido o melhor da minha vida em uma parte, o pior em outra, mas com certeza, foi o mais longo e mais cansativo.

Bom, mas eu fiquei muito feliz por lembrar do sonho... Não me conformaria em esquecer o beijo de Frederic, o toque macio de sua pele, o seu olhar violeta. Tudo tinha sido perfeito demais para ser esquecido em um despertar, mas um final de despedida foi o bastante para transformar as lágrimas que eu derramava sorrateiramente no caminho de volta em lágrimas de tristeza, e não de felicidade.

- Acordou? – Perguntou meu pai, olhando rapidamente para mim pelo espelhinho do carro que até hoje eu ainda não sei o nome.

Só havia nós dois no carro. Ele dirigindo, e eu deitada no banco do fundo da SW4 que antes era dirigida por Lucas.

Minha resposta foi um bocejo acompanhado de um “sim”.

- Ah, obrigado por ficar esse tempinho com a sua avó. – Começou papai. - Acho que agora que você voltou, posso dizer que o braço dela foi apenas um pretexto para te empurrar um pouquinho para Boa Vista.

Ouvi ele rir, então os olhos verdes dele percorreram o espelhinho mais uma vez para ver a minha expressão.

- Tudo bem... Eu estava com saudades dela. – Respondi enquanto fitava os detalhes do modo de dirigir do meu pai, lembrando do modo que como Lucas dirige e comparando os dois.

Incrível como eram parecidos! Até a mania de bater os três dedos no volante a cada minuto era a mesma!

- Ela também sente a sua falta. – Disse ele ao mesmo tempo em que batia os três dedos no volante mais uma vez, prendendo a minha atenção.

Não respondi ao comentário, nem voltei a dormir.

Um tempinho depois, papai voltou a puxar assunto.

- Então, está com saudades do seu irmão?

- Do Lucas? – Perguntei ainda incrédula com o fato de o meu pai ter se referido a Lucas como meu irmão, era a primeira vez que ele fazia isso!

- Sim.

- Ah... Uau! É a primeira vez que você se referir a ele como... Como meu irmão.

Pelo espelhinho, vi ele sorrir.

- Bom, acho que de agora em diante é assim que deve ser. Afinal, ele é meu filho e você também. Vocês são irmãos, Letícia.

Sorri também. Era bom ver que ele estava de bem com esse fato.

- Sim, estou morrendo de saudades do MEU IRMÃO! Não vejo a hora de ir visitá-lo hoje! – Respondi. – Mas... Pai, quando você e Clarisse pretendem contar isso a ele? Que ele é meu irmão e tal. – Perguntei.

- Isso vai ser bem... Complicado. Vamos esperar ele se recuperar primeiro... Talvez daqui a alguns meses...

- MESES?

- Tente entender, querida. Ele ainda está se recuperando, não podemos abalar a mente dele com um choque assim, não agora.

Suspirei. Eles sabiam o que estavam fazendo...

Peguei o meu MP4 e passei o pouco que restava da viajem ouvindo música.

Chegamos em casa antes da hora do almoço.

Passei pela porta e fui logo em direção a escada que me levaria ao meu quarto (meu refúgio). Mas tive que voltar quando ouvi minha mãe gritar:

- Letícia, tem visita para você!

- Oi mãe. – Falei enquanto tirava os fones do ouvido. Se ela não tinha a compaixão de dar um “oi” para a filha depois de um dia sem vê-la, eu, pelo menos, teria que tentar dar o meu exemplo (mesmo que ela não fosse segui-lo). Quando vi que ela nem se quer tinha notado a minha tentativa de dar um “oi” antes de falar sobre qualquer outra coisa, resolvi entrar no assunto dela - Para mim?

- Sim. – Ela sorriu e desviou o olhar para a entrada da sala.

- Quem é? – Perguntei enquanto descia as escadas preguiçosamente.

Com mais um sorriso, ela abaixou o tom de voz e respondeu:

- Jackson.

Revirei os olhos e dei meia volta em direção ao meu quarto, agora, mais rapidamente.

- Letícia, volte aqui! – Gritou mamãe.

- Sem chance. – Respondi sem olhar para trás.

Ouvi alguns passos novos, então, ouvi outra voz:

- Pode deixar, Sr. Xavier. Ela vai acabar falando comigo. – Voz fútil. Era ele: Jack.

- Oh, querido, pode me chamar apenas de Lúcia. Desculpe pela Letícia...– Minha mãe falava com Jack com a voz mais doce do mundo, não entendia como ele conseguia fazer com que ela fosse tão generosa com ele... Ah, entendia: O pai dele era político. – Aliás... Por que não aceita almoçar conosco como desculpas?

- É lasanha? – Perguntou ele rapidamente, mas eu sabia que ele não estava interessando na comida, e sim em me provocar.

- Sim. Passei na cozinha e conferi que estava cheia de queijo!

- Hmmm, acho que vou aceitar. – Era só eu que ouvia a provocação na voz dele?

Eu não estava agüentando mais aquela farsa de Jack. Ele se fazendo de bonzinho, e a minha própria mãe no papinho dele. Juntei isso com toda o meu descontrole por não ter mais o meu anjo, e com a raiva que agora eu sentia por Jack e Selena, não só pelo fato de eles terem me traído, mas também porque me abandonaram no momento em que eu mais precisava de amigos, e foi por causa desse abandono que Frederic surgira em minha vida.

Se Jack e Selena nunca tivessem me traído, eu teria passado pelo problema de Lucas sem a ajuda de um anjo, porque eu teria tido amigos. Mas não, eles me traíram... E foi preciso alguém do outro mundo me ajudar. E esse alguém eu nunca mais iria ver. Nunca mais teria notícias. Talvez tivesse sido melhor se Frederic nunca tivesse aparecido. Assim eu não teria que passar pela dor de sua perda e, acredite, essa dor era muito pior agora do que a dor de ver Lucas na UTI ou a dor de ter sido traída. E eu sabia muito bem porque isso estava doendo tanto...

Eu tinha perdido o amor da minha vida.

Ou melhor, o meu amor.

Eu já estava na ponta da escada. Imaginei o olhar sonso de Jack lá em baixo e não resistir em jogar para ele o meu olhar furioso.

Mas só isso não bastava. Eu precisava falar.

- Jackson, o que há com você? – Comecei. Eu não estava prestando atenção no que eu estava falando, apenas falava o que vinha na cabeça. Tanto Jack, como minha mãe me encaravam incrédulos. Continuei: - Já não basta ter me traído com a Selena, que eu pensava ser a minha melhor amiga? Não basta ter me abandonado quando eu mais precisei? Agora, o que você quer? Quer acabar comigo de vez? É isso? Porque se for, eu tenho uma boa notícia pra te dar: Eu já estou acabada.

O tempo em que fiquei ali, parada, olhando os rostos surpresos de Jack e mamãe, pareceu uma eternidade. Por um momento achei que estivesse vendo um filme... Tudo que tinha acontecido no decorrer do último mês até agora. Achei até que estivesse vendo Selena, Lucas e até Frederic escada abaixo. Mas eu sabia que eles não estavam ali. Eram apenas as lembranças. Algumas boas, como as que eu tinha das tarde com Frederic na pracinha. Ou, como as lembranças das vezes em que Lucas me levava para a escola e me fazia dar o primeiro sorriso do dia.

Só que, algumas dessas lembrança nunca iriam se repetir. E uma dessas pessoas – ou melhor dizendo, anjo – eu nunca mais iria voltar a ver na minha vida. E foi isso que me fez derramar lágrimas.

- Sr. Xa... Ops, Lúcia, acabei de lembrar que tenho um compromisso para agora. – Jack falava apenas com a minha mãe, mas os olhos dele estavam voltados para mim. Pelo jeito ele havia entendido a minha mudança de humor. – Não poderei ficar para almoçar.

Suspirei. Sem a provocação de Jack, eu ficaria com um atormento a menos.

- Ora essa! Não ligue para a Letícia agora. Ela acabou de chegar de viajem, sempre fica assim depois de voltar da casa da bruxa! – O tom de voz da minha mãe era alto o bastante para que eu pudesse ouvir, e era isso que ela queria: que eu ouvisse. Mamãe (não sei porque ainda a chamava assim, não era esse o papel que ela vinha fazendo desde que o meu pai entrou para a política) virou-se para mim com um olhar de quem cobrava alguma coisa – Aposto que a Letícia adoraria ter você na mesa, ela é quem mais te deve desculpas.

Revirei os olhos.

- Na verdade, não. – Começou Jack – Eu é quem devo desculpas a ela. Eu tive a chance de ficar com ela, mas desperdicei. – Ele abaixou a cabeça, então, continuou – Eu só queria que ela soubesse que eu estou arrependido do que fiz.

Eu apenas fiquei parada por um tempo. Jack voltou a olhar para mim. Ele parecia tão sincero como no dia em que havia me beijado na escola, só que dessa vez, eu sabia que ele não ia me forçar a nada. Era como se ele tivesse mostrando isso no momento em que jogou fora a oportunidade de passar o almoço me atormentando com aqueles cílios imensos e o sorriso sínico que só ele tinha.

- Mãe... – Chamei. Ela já estava olhando para mim, apenas acenou com a cabeça para mostrar que estava prestando atenção no que eu ia falar. Mas em vez de falar, apenas desviei os olhos para a sala, e ela rapidamente entendeu que eu queria que ela me deixasse a sós com Jack.

A reação dela foi a que eu esperava: um sorriso.

- Bom... Vou dar uma última olhada no almoço. As moças da cozinha param demais para fofocar, tenho que ficar no pé. – Disse ela, obedecendo ao meu pedido. Antes de sair, ela ainda jogou uma piscadela para mim e outra para Jack.

Larguei a mochila na escada e desci os degraus me escorando no corre-mão.

- Vai me perdoar? – Perguntou Jack assim que eu cheguei ao primeiro degrau da escada.

- Hum... Acho que perdoar é legal. – Respondi.

Ele sorriu.

- E vai me dar uma segunda chance? – O certo seria dizer “pediu” ou “perguntou”? Bom. Acho que isso foi um pedido.

- Não. Isso não. – Respondi rapidamente.

Os olhos dele caíram e o ouvi resmungar algo como “Que droga!”.

Pensei por um instante. Frederic não iria voltar, e eu não podia parar a minha vida. Claro que eu nunca iria esquecer dele, nem mesmo imaginava amar alguém de novo... Mas mesmo assim, eu não podia usar Jack apenas para esquecer um anjo. E além do mais, eu não queria mais nada com Jack. Bom, talvez...

- Amigos? – Perguntei enquanto estendia a mão com um sorriso que eu nunca pensei dá a Jack.

Ele olhou a minha mão no ar por um tempo, e à medida que os segundos passavam, eu ia me arrependendo de ter feito essa proposta.

Por um momento, até pensei que ele fosse aceitar a minha amizade com um sorriso no rosto.

Mas não foi isso que ele fez...

- Não. – Respondeu Jack friamente. Os olhos dele pareciam mais furiosos com a proposta de amizade do que com o pedido de “volta” recusado.

Voltei a mão para perto de mim.

- Tudo bem. – Falei – Sinto muito. Eu realmente estava querendo ser sua amiga.

- Desculpe. Não posso ser apenas o seu amigo. Vai contra o meu orgulho.

Dizendo isso, Jack virou as costas, abriu a porta e se foi.

Como eu já imaginava, mamãe estava por perto ouvindo a conversa.

Portanto, não fiquei nem um pouco surpresa quando vi aparecer de repente vomitando as palavras.

- Letícia! Como pôde recusar o pedido de Jack? Ele é um gato! – Disse ela.

- Fique com ele e descubra o idiota que ele é. – Falei. Eu ainda estava chateada com a reação dele em relação ao meu pedido de amizade.

- Não seja boba, menina! – Resmungou Lúcia - Mas o garoto disse que estava arrependido!

- Mamãe, se ele estivesse arrependido e gostasse mesmo de mim, aceitaria a minha amizade. – Depois de um tempo esperando mamãe absorver a minha decisão, falei – Vou subir e tomar um banho, depois do almoço vou visitar o Lucas.

- Lucas! Lucas! Lucas! – Lúcia saiu reclamando em direção a cozinha, a ouvi repetir o nome de Lucas com desdém até ela ficar longe o bastante a ponto de eu não escutar mais a sua voz.

Quando o som do silêncio predominou, voltei a subir as escadas. Peguei a mochila que eu havia deixado em um dos degraus e me dirigi ao meu quarto.

Era estranho como o quarto parecia diferente. Sombrio até.

As paredes brancas com detalhes lilás não eram mais tão claras, e nem a janela aberta conseguia iluminar o ambiente. O silêncio chegava a ser assustador.

Tentei ignorar a diferença que a ausência de Frederic havia causado, mas não estava dando certo.

Larguei a mochila em cima da cama e liguei o computador. Conectei o MP4 ao PC e coloquei as caixinhas de som no volume máximo.

O mal estar estava me matando, eu não conseguiria ficar naquele quarto por muito tempo. Era lá onde eu passava a maior parte do tempo com Frederic, e lembrar-me dele não estava me fazendo bem.

Eu tinha que esquecê-lo.

Mas não era isso que eu queria.

O que eu devia mesmo era me lembrar dele como se ele fosse algo irreal, apenas fruto da minha imaginação. Mas eu sabia – bom, acho que sim – que ele não era fruto da minha imaginação, e mesmo se fosse, o que eu sentia – Frederic sendo real ou não – era verdadeiro.

E eu continuava amando-o mesmo sem ele por perto.

Tomei o meu banho e desci para almoçar.

Almoço monótono.

Era hora de ir visitar Lucas.

Meu pai não pôde ir ao hospital comigo, pois recebeu uma ligação de última hora da câmara municipal pedindo a sua presença em uma reunião. Então, ele apenas me deixou na porta do hospital.

- Boa tarde, Clarisse! – Falei assim que a vi na recepção do hospital, tomando um suco.

- Boa tarde, Letícia! Que bom que veio! Lucas está louco para vê-la.

- Eu também estou com saudades dele. – Falei – Posso ir para o quarto agora?

- Ah, pode sim, querida! Você já sabe o caminho?

- Sei sim, Clarisse. Até mais!

Passei rapidamente pelos corredores do hospital, dando “Boa tarde” a todos que eu encontrava no caminho.

A porta do quarto estava fechada. Bati uma vez, mas ninguém respondeu.

Estranhei, mas mesmo assim arrisquei abrir a porta.

Daí veio o susto:

O quarto estava vazio. A cama bagunçada. E a janela aberta.

Engraçado como sempre pensamos besteiras nas horas de pânico, não?

Por sorte, logo ouvi a voz de Lucas atrás de mim.

- ... tudo bem, é melhor andar do que ficar sentado o dia todo. – Falava ele.

Virei as costas e vi Lucas apoiado em uma daquelas muletas, acompanhado por uma enfermeira jovem e bonita.

- Lucas! Que susto você me deu, não sabia que já estava passeando pelo hospital.

- Letícia! – Exclamou ele ao me ver – Que bom que veio! Pois é... Insisti que a Luiza me levasse para dar uma volta hoje, estava cansado de tanto ficar na cama. A única coisa ruim nisso, é que eu tenho que levar esse soro para todos os lugares.

- Olá, você é a tão famosa Letícia? – Disse a enfermeira de boa aparência. Ela parecia ser simpática. Cabelos louros presos em uma poupa, típico uniforme branco e um sorriso que deixaria qualquer paciente de bom humor.

- Olá. Você é...

- Luiza Bonfim. Estou cuidando do seu irmão.

Franzi a testa e olhei para Lucas que me respondeu com uma piscadinha de olho.

- Ah... Claro.

- Então... Vou colocar o Lucas e o soro dele no lugar certo e deixarei vocês em paz. – Disse a enfermeira sorridente.

Sai do caminho para que ela acomodasse Lucas no lugar certo.

Ele parecia 100% melhor.

Claramente ainda não tinha forças para andar sem as muletas, mas já parecia ter recuperado a sua cor normal.

A enfermeira saiu deixando Lucas e o soro nos seus devidos lugares.

- A Luiza parece ser bem legal. – Comentei enquanto arrastava uma cadeira para mais perto da cama de Lucas.

- Sim, ela é. – Disse ele – Não comente nada, mas assim que eu sair daqui vou convidá-la para jantar.

- Uau. Pode deixar que eu não vou comentar nada.

- Acha que ela vai aceitar?

- É lógico! – Respondi.

- Maravilha! – Lucas esfregou as mãos, animado.

- É bom ver que está se recuperando bem.

O tom da minha voz estava desanimado, ao contrário da voz de Lucas.

Não fiquei surpresa quando ele percebeu isso.

- Ei, o que há com você? – Perguntou.

- Você não iria acreditar... – Respondi – É meio... complicado.

- Hum... Não posso saber nem o básico?

Pensei por um minuto.

- Bom... Estou querendo esquecer alguém.

Ele mordeu os lábios e percebi que ele estava pensando.

- Esse alguém seria Jack?

- Não.

- Uau, eu fiquei tanto tempo fora? – Lucas riu.

- Para mim, sim. – Respondi.

- Então, Lê... Não quer me contar sobre esse “novo amor”?

Fiz uma careta.

- É um amor impossível. – Eu disse.

Depois de um tempinho absorvendo o comentário, Lucas voltou a falar:

- Eu passei quase um mês mergulhado no mundo dos sonhos e pesadelos. Lembrei de coisas que eu havia esquecido a tempos, e posso te jurar que vi um anjo de olhos de violeta e...

- O QUE? Você viu um anjo de olhos de violeta nos seus sonhos? – Perguntei eufórica.

Ele me olhou torto, então, respondeu desconfiado:

- Bom... Eu não consegui ver o rosto dele. Só me lembro dos olhos... Foi isso que ele disse: que era um anjo. Ah! Ele falou de você.

Eu sorri.

- O que ele disse sobre mim?

- Não me lembro muito bem... Mas foi algo como “Não deixe a Letícia, ela gosta muito de você”. Isso foi quando eu estava quase desistindo, indo até a luz.

Eu não estava entendo muito bem o que ele queria dizer com isso. Mas parecia que Frederic havia pedido para Lucas ficar por mim no momento em que ele estava quase desistindo de viver.

- Por que tanta curiosidade nisso? – Perguntou Lucas com o mesmo tom desconfiado de antes.

- Nada... É só que eu acredito em anjos. Não ria.

Ele não riu.

- Eu não acreditava até esse sonho. Agora acredito. Fico pensando se todos eles tem olhos de violeta...

- Não, não... Os anjos tem a mesma forma física de quando eram humanos. Qualquer um pode morrer para salvar alguém e se tornar um anjo. – Tagarelei. Só depois percebi o olhar assustado de Lucas – Bom... Foi isso que eu li na internet.

- Acho que você deve parar de ler ficção. Está ficando maluca. – Zombou Lucas.

- Não seja bobo. – Eu ri.

- Está vendo? Consegui fazer você rir! – Disse ele como se tivesse marcado um gol em plena copa do mundo.

- Você sempre consegue isso! – Ri novamente.

Era legal estar com Lucas. Ele amenizava a dor da perda de Frederic assim como Frederic amenizava a dor a da ausência de Lucas.

Mas eu tinha que admitir que a dor da ausência de Frederic estava sendo mais forte. Porque ela atingia uma parte do meu coração que eu nunca tinha sentido: a parte da paixão.

Eu e Lucas ficamos conversando até o horário de visita acabar.

Me despedi dele e fiquei pensando no que eu iria fazer agora.

Uma estranha vontade de ir até a pracinha apareceu, e eu segui essa vontade.

De pé mesmo, fui até a pracinha.

Parei no meio do caminho para tomar um sorvete.

Nesse dia estava quente em Conquista.

Pensei sobre a escola enquanto tomava o meu sorvete, sentada sozinha em um dos banquinhos da praça.

No dia seguinte seria a Festa de Fim de Ano. Eu não tinha mais a mínima vontade de ir, mas sabia que mamãe me obrigaria.

O boletim seria pego hoje. Eu sabia que já tinha passado, pois na terceira unidade eu já tinha completado os 28 pontos obrigatórios de cada matéria.

Provavelmente, a escola ligaria para a minha casa amanhã pedindo que eu fosse ajudar na arrumação. Todo ano era assim.

Nos anos anteriores havia sido divertido. Jack e Selena ainda eram meus amigos, e eu acabava me divertindo com eles e os meus outros colegas enquanto arrumava o ginásio da escola.

Mas agora eu não tinha amigos, nem na escola, nem fora dela. Quer dizer, eu tinha Lucas, mas ele ainda estava no hospital.

Oh... Se Frederic não tivesse ido embora...

- Ei. – Uma voz me chamou.

Frederic? Era ele?

Me virei com um enorme sorriso – provavelmente sujo de sorvete de chocolate – e logo tive a decepção.

- Quer comprar um algodão doce? – Perguntou o homem que havia me chamado antes.

- Oh, não. Obrigada. – Respondi decepcionada.

Eu teria que me acostumar com o vazio.

Frederic não voltaria.