Personalie

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

CAP. 10 – Retorno

A pior parte do meu dia nas férias eram as manhãs, pois, sem aula não havia nada pra fazer. Meu anjo só chegava um tempo depois de eu acordar, para evitar algumas situações embaraçosas, já que todas as manhãs eu costumo tomar banho.

Então, eu estava tentando acordar o mais tarde possível para que a parte da manhã sem o meu anjo passasse logo. Depois de vestida fiquei sentada na minha cama esperando o meu anjo chegar, ele sempre costumava chegar as 10 da manhã, eu sempre estava pronta a essa hora.

Olhei o relógio sobre a minha mesinha de cabeceira, ainda eram 9 da manhã, eu teria que esperar 1 hora inteira pelo meu anjo.

Deitei-me na cama e fechei os olhos, na tentativa de cochilar e fazer o tempo passar mais rápido.

Eu havia dormido tarde no dia anterior olhando fotos antigas, então, acabei pegando no sono mesmo. Só acordei com uma voz que eu conhecia muito bem me dando “Bom dia”.

Eu levantei abrindo um largo sorriso, o meu anjo também sorria.

- Bom dia. – Retribui entre um bocejo.

- Cheguei cedo demais? – Perguntou o anjo olhando a minha expressão cansada.

- Não, eu peguei no sono de novo. – Falei enquanto me levantava da cama. – Então, o que vamos fazer hoje?

- O que você quiser.

Eu pensei por um minuto, então respondi.

- Mais tarde podemos ir visitar Lucas, ainda não fui vê-lo essa semana.

Visitar Lucas sempre era uma coisa difícil a fazer, mas por outro lado eu sentia a necessidade de vê-lo, mesmo naquela situação.

Desci as escadas e fui direto para a cozinha, porém, não encontrei mais ninguém na mesa. Peguei meu cereal com leite e fui devorar meu café da manhã na sala ao mesmo tempo em que assistia TV.

Depois de terminar de comer eu e o anjo fomos à biblioteca, que não era muito longe de casa, ele me ajudou a escolher um livro para que nós dois lêssemos juntos.

Nós escolhemos “Pollyanna”, que fala de uma garotinha que fica órfã e vai morar com a tia, mesmo sendo rejeitada emocionalmente pela tia, Pollyanna tenta ver o lado bom de tudo, e assim ela joga o jogo-do-contente. Estávamos na parte em que ela conhece Jimmy quando bateram na porta do meu quarto dizendo que o almoço estava na mesa.

- Pai, hoje a tarde podemos ir ver Lucas? – Perguntei, minha mãe estava na mesa também.

Meu pai ia abrir a boca para responder, mas minha mãe se adiantou a criticar.

- Esse motorista de novo, Letícia?! – Reclamou ela dando um tapa de leve na mesa.

- Lúcia, não se dirija assim a Lucas, quando ele voltar irei promovê-lo a meu secretário particular, então a partir de hoje não quero ouvir nenhuma piada sobre ele. Lucas era muito amigo de nossa filha, e continuará sendo, então, seria melhor você respeitá-lo. – Disse meu pai enquanto se levantava da mesa.

Eu fiquei surpresa com a reação dele em defender Lucas desse jeito, eu nunca tinha visto meu pai enfrentar a minha mãe, e mais surpresa ainda por ele querer promovê-lo.

Antes da minha mãe começar uma briga eu me adiantei a falar.

- Ah, Lucas vai ficar muito feliz em ser promovido!

- Isso eu espero. – Sorriu meu pai – Sim, querida, vou com você ver Lucas, Clarisse precisa de uma força.

Naquela hora eu achei que mamãe fosse voar no pescoço do meu pai e apertar até ele suplicar perdão. Bem, o que ela fez não foi muito diferente...

- Victor, você não deve nada a essa mulher, não tem porque apoiá-la! – Disse minha mãe, ela apertava o garfo com força em sua mão, e por um minuto eu achei que ela fosse cravá-lo no meu pai.

Papai não respondeu, apenas virou-se em direção à porta sem dizer para onde ia.

Ouvi minha mãe resmungar alguns palavrões antes de sair da mesa.

- Acho que não vai demorar muito pro seu pai contar a verdade a sua mãe. – comentou o anjo ao meu lado.

- Eu espero que demore, tenho medo desse dia. – Eu disse pensando em como minha mãe reagiria, ou melhor, que método ela escolheria para matar papai.

Mal terminei de comer e voltei ao quarto, eu estava curiosa para saber o final do livro.

Eu e o anjo terminamos de ler Pollyanna antes das três da tarde. Depois ficamos um bom tempo comentando o livro e até tentamos achar uma situação onde o jogo do contente não iria adiantar.

- É, pensando bem, poderia ser pior... Então, fico contente por ter você comigo. – Eu disse.

Nós dois estávamos sentados no chão, um ao lado do outro.

- E eu fico contente por você estar contente. – Completou ele abrindo um largo sorriso.

Contente não era o que eu realmente estava, a felicidade não é algo que se tem por completo, uma parte de mim estava contente, mas a outra continuava a derramar lágrimas. Então, tentei utilizar apenas a parte feliz de mim e deixar a triste para depois, quando eu não estivesse com o meu anjo, como ele disse, se eu fico feliz ele também fica feliz, então acontece à mesma coisa quando fico triste, e eu não queria ver o meu anjo triste.

O relógio marcava 15:27h.

Depois de um tempo em silêncio eu voltei a falar.

- Bem, já são quase três e meia, acho que vou me trocar para ir ao hospital.

- Tudo bem, então, eu te espero lá embaixo.

Falando isso, o anjo saiu atravessando a porta do meu quarto.

Eu tomei outro banho e vesti um jeans escuro com uma blusa verde-cana com detalhes brancos nas mangas, troquei os cadarços azuis do meu tênis por cadarços verdes, da mesma cor da minha blusa, dei uma última olhada no espelho e logo depois desci as escadas.

O meu pai ainda não tinha chegado em casa desde que saiu na hora do almoço, minha mãe (pelo recado em cima da mesinha de telefone) tinha ido fazer compras, então, não havia ninguém para me levar ao hospital, já que o motorista foi levar a minha mãe e o meu pai também não estava em casa.

Peguei o telefone e disquei o número do celular do meu pai e pedi para ele vir me buscar.

Em menos de dez minutos o carro parou na porta de casa, o anjo já estava atrás de mim.

Abri a porta da frente e o anjo atravessou a porta do banco de trás entrando no carro também.

- Onde você estava? – Perguntei ao meu pai enquanto fechava a porta.

- Fui dar uma volta, passei no escritório e depois fui à banca de jornais. – Respondeu ele.

Antes de ir ao hospital, passamos na casa de Clarisse para levá-la conosco.

Depois que eu descobri que Lucas é meu irmão fiquei um pouco chateada com papai e Clarisse por não terem me contado antes, mas depois vi que a única pessoa ainda culpada nessa história era Clarisse, que escondeu a verdade de todos, então, perdoei papai, eu já não sentia tanta raiva de Clarisse, voltei a falar com ela, mas não como antes, eu a via como uma segunda mãe, mas agora eu estava magoada e não conseguia mais vê-la assim.

- Olá Letícia. – Disse ela ao entrar no carro.

- Olá. – Eu disse sem sorrir.

Meu pai me jogou um olhar de decepção, que não fez com que eu voltasse atrás e sorrisse para Clarisse.

O resto do caminho foi silencioso, ninguém falou nada.

Clarisse ia no banco de trás ao lado do anjo, claro, sem saber que estava ao lado dele.

Quando chegamos ao hospital, eu fui a primeira a descer do carro. Seguida pelo anjo, meu pai e por fim, Clarisse.

Como sempre, passamos primeiro na recepção.

O cheiro do hospital não me trazia boas lembranças, lembrei do dia que eu descobri que Lucas era meu irmão e eu quase morri atropelada, se não fosse por Jack...

Urgh! Eu odiava pensar que devo a minha vida a Jack!

Depois das aulas não o vi muitas vezes. A última vez que nos falamos foi aqui no hospital.

Mas, eu não queria pensar em Jack, ele é um assunto que me deixa nervosa.

Eu sentei no sofá branco da recepção enquanto meu pai falava com a balconista. Uns dois minutos depois uma enfermeira nos levou até a sala de UTI.

Nós três vestimos um roupão azul com tocas e luvas brancas por cima das nossas vestis normais.

Meu pai e Clarisse entraram juntos na pequena sala onde Lucas estava ligado a vários fios. Eu olhei do vidro enquanto Clarisse se inclinava na cama para beijar a cabeça enfaixada de Lucas, meu pai fez o mesmo. Eles ficaram um tempo ali, olhando para Lucas, eu não podia ouvir o que eles conversavam, mas pelo jeito que Clarisse mexia a boca e olhava para Lucas ela parecia falar sobre ele, meu pai apenas ouvia sem falar nada. Dava pra ver algumas lágrimas no rosto de Clarisse, meu pai parecia tentar segurar as dele.

Clarisse e meu pai deram outro beijo na testa de Lucas. Clarisse caminhou até a porta e jogou um beijo para Lucas, sem vida naquela cama, meu pai apertou a mão dele, então, eles saíram da sala.

- Querida, você quer que eu entre com você? – Perguntou meu pai a mim.

- Não, eu... quero falar com ele, eu sei que ele não vai me ouvir, mas...

A enfermeira abriu a porta pra mim, meu pai e Clarisse olhavam do vidro enquanto eu entrava em direção a Lucas.

Cheguei ao lado da cama dele, eu estava tremendo, a cada segundo eu sentia um calafrio no meu corpo, eu tentava não chorar, mas não era possível.

- L-Lucas – sussurrei pegando a mão dele – Oh, você não sabe o quanto está me fazendo falta... E-eu sei que você pode não estar me ouvindo, mas... mesmo assim eu quero que você saiba que você mora no meu coração, e que... onde quer que você esteja eu estarei com você, mas eu te peço, por favor, que esse lugar seja perto de mim, que você volte a sorrir, que você abra seus olhos e me deixe vê-los brilhar novamente... que você levante dessa cama e volte a ser aquele Lucas feliz, que me faz rir, que esbanja felicidade – Eu apertei a mão dele pela última vez antes de soltar.

Eu limpei as minhas lágrimas e depois me inclinei sobre a cama, beijando o rosto pálido dele.

- Eu te amo... irmão. – falei sussurrando a última palavra.

Eu alisei a mão dele pela última vez antes de sair da sala, eu já ia tirar a minha mão quando senti um leve aperto.

Eu olhei em direção a minha mão sobre a de Lucas, ele apertava a minha mão.

- Lucas? – Sussurrei voltando para perto do rosto dele.

Levemente eu vi suas pálpebras se levantarem, piscaram três vezes, agora eu via claramente os seus olhos verdes brilharem.

- Le-tícia. – Sussurrou Lucas com a voz fraca e os olhos levantados forçadamente até mim.

De repente eu me vi sorrir.

Eu senti meu coração se interar novamente, como uma ferida, que dói por um tempo e de uma hora pra outra sara.

- Lucas? LUCAS? Você está me ouvindo? Lucas? – Gritei eufórica.

- S-sim. – sussurrou ele levantando a mão até mim, eu segurei a mão dele. Um pequeno sorriso pareceu surgir no canto da boca dele.

Ele fechou os olhos novamente, eu me desesperei, mas foi por pouco tempo, logo ele os abriu de novo.

- Lucas, espere, não durma! Agüenta firme que eu vou chamar o médico.

Eu corri até a porta, do outro lado do vidro meu pai estava de costas conversando com Clarisse e a enfermeira.

- Enfermeira! – Gritei – O LUCAS! ELE...

Eu tentei formular as palavras, mas eu estava tão feliz que falar se tornava difícil.

- Oh, meu Deus, diga logo, o que aconteceu com Lucas? – Perguntou Clarisse.

- Clarisse... Pai, LUCAS ACORDOU! – Gritei abraçando Clarisse e meu pai de uma vez só.

A enfermeira correu até a porta, passando para o outro lado da sala da UTI onde Lucas estava na cama.

Lágrimas e mais lágrimas escapavam dos meus olhos, mas essas não eram de tristeza.

Eu me soltei do abraço de Clarisse e meu pai, que foram atrás da enfermeira.

Olhei para trás a procura do meu anjo.

Ele sorria, mas não parecia muito feliz.

- Hey, Lucas acordou! – Pulei até ele, alegremente.

- É, eu vi – disse ele abaixando os olhos.

- Algum problema? – Perguntei.

- Letícia, agora só falta descobrir quem eu fui para nossas missões estarem completas, agora que Lucas voltou...

- Mas... podemos demorar a descobrir. – Falei sorrindo maliciosamente.

- Talvez... Mas... e se eu me lembrar? E se você acabar descobrindo por acaso? E também... eu preciso saber quem eu fui, Letícia. Isso me incomoda muito.

- Anjo, podemos conversar mais tarde? Preciso aproveitar o momento, meu melhor amigo acabou de acordar depois de quase um mês em coma! – Falando isso eu saí saltitante em direção a Lucas.

- Letícia... – O anjo me chamou novamente.

Eu olhei para ele, eu não entendia a sua expressão de dor, triste... Só então percebi que eu estava deixando-o de lado.

- Oh, me desculpe – eu disse corando – Bem, quer vim comigo?

Ele fez uma careta, então falou.

- Não, não vou estragar ‘o momento família’. – disse ele em um tom que eu não conhecia, ele parecia chateado.

- Você volta à noite? – Perguntei, quase pedindo, suplicando.

- Talvez perto da meia noite. – Respondeu ele no mesmo tom – É melhor você voltar agora.

Ele atravessou a porta que leva ao corredor sem esperar a minha resposta.

Corri até a porta com esperança de encontrá-lo no corredor, mas ele já havia sumido.

Eu fiquei paralisada por um momento, eu não entendia o porque dessa revolta dele. Agora eu me sentia culpada por não ter dado a atenção que ele merecia, oh meu Deus, como fui idiota com o meu anjo...

- Letícia, onde você vai? – Perguntou o meu pai atrás de mim.

- Oh, lugar nenhum... eu só...

- Querida, por que você está chorando?

Eu passei a mão no rosto, eu não percebi que estava chorando.

- Ah, não é nada. Como Lucas está? – Mudei de assunto.

Meu pai sorriu.

- A enfermeira disse que ele vai ficar bem, mas ainda está tonto por ter ficado tantos dias desacordado.

Eu sorri de volta.

- Letícia... seria melhor se você não comentasse com Lucas sobre “você-sabe-o-quê”.

Eu interpretei que “você-sabe-que-o-quê” seria o fato de Lucas ser meu irmão. Eu não tinha a intenção de contar nada a Lucas agora, mesmo não sabendo muito sobre medicina, eu sei que não seria bom para ele levar um susto desses nesse momento, depois de tanto tempo desacordado. Então, eu concordei com a cabeça.

Lucas não estava mais na UTI, agora ele estava no quarto. O médico havia dito que ele não corria mais nenhum risco de vida, e que pela lucidez dele, se recuperaria rapidamente. Eu, meu pai e Clarisse não saímos do lado dele desde a hora que ele acordara. Ele não falava muito, sua aparência ainda era pálida, mas ao passar do tempo ele parecia ter mais e mais vida e ficar mais falante.

- Eu não tenho mais cabelo? – Perguntou ele com a voz ainda fraca, mas sem perder o sarcasmo.

- Foi preciso cortar para retirar a bala, mas vai crescer novamente, querido. – Sorriu Clarisse.

As cortinas do quarto de hospital estavam abertas, a luz do sol não atravessava a vidraça da janela, pelo tempo que já havia passado desde que Lucas acordara parecia que já era tarde da noite.

Eu não sabia se encontraria o meu anjo ao chegar em casa, eu esperava que sim, eu devia desculpas à ele. O anjo tinha razão, o meu tempo com ele estava acabando, e o meu novo tempo com Lucas só começando, já que agora nós não somos apenas grandes amigos, mas também irmãos. Eu não queria dar menos atenção à um do que ao outro, mas depois de tanto tempo sem Lucas eu acabei esquecendo do meu anjo por um minuto, logo ele que tem me sustentado por tanto tempo, que tem sido a minha corda desde que eu desabei, e agora que Lucas voltou eu já me segurava na beira do penhasco, só esperando o meu anjo para sempre comigo para voltar a superfície, não necessariamente “para sempre”, pois esse termo só existe em histórias de princesas e contos de fadas, e aqui é a vida real, onde tudo é real, onde as pessoas morrem e os anjos vão embora, doa a quem doer, a vida é assim; e infelizmente temos que aceita-lá e tentar ser feliz vendo o lado bom de tudo, como em Pollyanna.

- Letícia, você está tão... calada. – Comentou Lucas quando meu pai e Clarisse saíram do quarto. – Não vai me contar as novidades?

- Oh, sim, as novidades... Bem, acho que a maior delas é que eu e Jack não estamos mais juntos. – Menti, já que a maior novidade era a que somos irmãos, mas esse não era o momento certo para contar a ele, seria melhor esperar ele estar completamente recuperado.

- Sério? – Perguntou ele, um sorriso crescia no canto dos seus lábios.

- É, você estava certo... Ele não era o cara certo.

Ele não respondeu nada imediatamente, apenas sorriu levemente.

- Bem... acho que eu devia ter te contado antes, mas pelo jeito você descobriu. Eu não queria acabar com o seu conto de fadas falando sobre seu ex e sua amiga e... – Falou ele depois de um tempo.

- O que? Você sabia sobre Jack e Selena e não me contou nada? LUCAS! – O interrompi, eu não conseguia acreditar que até o meu próprio melhor amigo sabia de tudo, menos eu!

- Bom, eu dei algumas indiretas. Desculpe-me, eu achei que não era a coisa certa a fazer.

Eu não queria discutir com Lucas logo agora, que ele tinha acabado de voltar, então, sorri demonstrando que ele estava perdoado.

Nós ficamos em silêncio até que a enfermeira entrou.

- Desculpem-me interromper a reunião, mas agora o paciente vai ter que tomar um medicamento e dormir um pouco – disse a enfermeira – Você pode voltar amanhã.

- Medicamento? Dormir? Não é preciso, eu estou bem, e além do mais, já dormir por quase um mês inteiro! – Reclamou Lucas.

- Lucas, é melhor obedecer a enfermeira, ela sabe o que fazer. Não seja cabeça dura! – eu disse – Bem, amanhã eu volto.

Me inclinei sobre a cama e beijei a bochecha dele nos dois lados, ele beijou a minha testa.

- Tudo bem ‘senhora sabe tudo’, vou fazer tudo que a ‘senhora sabe mais’ mandar. – concordou Lucas revirando os olhos.

A enfermeira riu, assim como eu.

Eu acenei com a mão em direção a Lucas antes de sair do quarto, ele acenou de volta.

Agora era a vez de dar atenção ao meu anjo, eu estava planejando o meu pedido de desculpas pela minha atitude de hoje no hospital, quando Lucas acordou. Eu me sentia mal por deixar o anjo de lado de alguma forma, eu estava culpando a mim mesma por não ter dado a atenção que ele merecia. Mas por outro lado eu também estava um pouco chateada, pois, como meu anjo da guarda ele devia estar feliz por mim, e também não devia ter tido um ataque de ciúmes (eu acredito que tenha sido isso) só porque eu dei uma atenção especial ao meu irmão que acabara de acordar. Olhando a coisa desse ângulo, o anjo que tinha sido infantil e egoísta, pois, ao invés de me abandonar ele devia estar comigo, não só nos momentos tristes e de solidão, mas também nos felizes.

Mas, talvez os anjos da guarda sejam assim. Quero dizer, só estão com você quando você realmente precisa deles. Na verdade isso é um fato (como o anjo já tinha me contado antes, depois que nossas missões fossem cumpridas ele teria que ir embora. E a missão dele estaria cumprida assim que eu voltasse a ser feliz como eu era antes, e com Lucas de volta a minha felicidade estava completa, já que motivo da minha tristeza era a ausência dele.), mas eu não queria que o meu anjo fosse embora, mesmo eu já tendo Lucas de volta comigo, afinal, o anjo tinha conquistado um espaço especial no meu coração, e desse espaço ninguém podia tomar conta além dele mesmo, nem o meu irmão.

Papai entrou no quarto novamente para se despedir de Lucas, Clarisse iria passar a noite no hospital.

Eu e meu pai voltamos sorridentes para casa, já eram quase dez e meia da noite quando paramos o carro na garagem.

- Posso saber onde vocês estavam? – Exigiu minha mãe, ela nos esperava na sala.

- Fomos ver o Lucas – disse meu pai com naturalidade na voz.

- Mãe! Lucas acordou! – Contei entusiasmada.

- Hum, vejo que logo teremos dois motoristas – comentou minha mãe com seu sorriso malicioso enquanto pegava uma revista de moda em cima do centro e se sentava no sofá.

- Lúcia, eu já disse que vou promover o Lucas, por favor, não vamos discutir mais sobre esse assunto. – Falando isso meu pai subiu as escadas, provavelmente para o quarto dele. Deu pra ver que ele estava fugindo da briga que a minha mãe estava tentando provocar.

- Eu vou subir também, boa noite mãe. – Falei subindo as escadas.

- Letícia, vá comer alguma coisa antes de dormir. – Ordenou ela sem tirar os olhos da revista.

- Mas mãe... – Tentei inventar uma desculpa para a minha pressa de ver logo o meu anjo, porque se eu contasse a verdade ela provavelmente me internaria num manicômio.

- Mas nada, você precisa organizar a sua alimentação!

Eu vi que não ia ganhar aquela discussão, e também, eu estava com fome, então, me dirigi até a cozinha para pegar o meu lanche preferido: bolo de chocolate com coca-cola.

Levei o lanche para comer no quarto, mas antes de devorar tudo resolvi tomar um banho.

Vesti um pijama confortável e fresco, estava calor hoje, então fechei a janela e liguei o ar-condicionado.

Sentei no chão com o meu lanche no colo e fiquei esperando o meu anjo chegar. Se é que ele ia chegar... já que ele disse “talvez perto da meia noite”. O relógio marcava 23:37h, então se ele ia mesmo aparecer já era para ele estar chegando.

Terminei de comer e deixei o prato e a latinha de coca embaixo da cama, depois, voltei ao canto da parede esperando o meu anjo chegar, como eu esperava.

Faltavam apenas dez minutos para a meia noite e até o momento nada do anjo aparecer, eu já estava quase indo para a cama quando ouvi alguém me chamar.

- Letícia. – Eu conhecia essa voz, era por ela que eu esperava.

Um largo sorriso cresceu no meu rosto.

- Anjo! – falei enquanto me levantava – Oh, me desculpe, eu devia ter te dado mais atenção e...

- Não se culpe, eu que fui egoísta. – Interrompeu-me ele se aproximando. – Então, como o Lucas está?

- Ah, ele está bem, o médico disse que ele vai se recuperar logo e que não corre mais nenhum risco! – Falei enquanto me sentava na cama.

- Isso é bom. Você deve estar feliz... – Disse ele enquanto seus olhos de violeta desabavam ao chão.

- É, eu ficaria mais feliz ainda se você também estivesse feliz.

Por um minuto ficamos em silêncio, o único barulho era o do ar-condicionado.

- Letícia, e-eu não posso ficar feliz sabendo que logo vou ter que me afastar de você, eu... não sei como vai ser depois – disse o anjo quebrando o silêncio.

A maneira como ele falou me fez corar levemente.

- Eu também não sei, anjo, só sei que de algum jeito você vai ter que continuar aqui, e-eu não serei feliz longe de você, mesmo com Lucas aqui.

- Lê, você vai acabar se esquecendo de mim quando Lucas estiver completamente recuperado, e aí você não precisará mais do meu apoio, e mesmo que a sua missão ainda não esteja cumprida, para mim será difícil ser deixado de lado, eu não vou querer ser um encosto.

- Pode ser que eu não precise mais do seu apoio, mas eu vou precisar da sua amizade. – Falei olhando dentro dos olhos dele, para que ele tivesse certeza de que eu falava tudo do fundo do meu coração.

A minha vontade era abraçá-lo, mas isso não era possível. Eu senti vontade de chorar, mas prendi as lágrimas, pois, sempre que eu chorava, ele se sentia culpado por não poder limpar as minhas lágrimas, e eu não queria vê-lo se sentir culpado.

Nós não falamos mais nada, eu não o vi ir embora essa noite. Me senti segura por saber que ele estava ali comigo, e assim eu esperava que fosse até o último dia da minha vida.

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